Mote: sorteado um pecado capital a cada elemento do grupo (aproveitando a coincidência de sermos em número de 7), escrever um texto sobre o pecado que coube em sorte.
Meu amor,
Hoje voltei lá. Digo-o sem vaidade, aliás não é coisa de que me orgulhe.
Como sabes, ela sempre me acompanhou. Desde pequenino. A minha mãe atafulhava-me. A minha avó via-me anafado e logo exclamava, cheia de orgulho: «está com tão boas cores!». Até nas mãos do meu avô paterno, sempre tão avarento, havia sempre uma moeda para mais uma guloseima. Hoje, quando penso no efeito de tudo aquilo, sinto uma ira imensa. Não deles, coitados, para eles era uma segurança. A minha raiva é de mim mesmo, por não conseguir controlar-me. Na verdade, foi sempre ela que controlou a minha vida. Não sei se por preguiça da minha parte, se por fraca força de vontade. Nunca resisti, nunca quis resistir, anseio por aquele prazer, é como uma orgia, há nisto um toque de luxúria.
No fim, resta-me a frustração e outros sentimentos menos nobres. Não imaginas a inveja que sinto de ti quando te olho na tua magnífica elegância.
Mas, dizia eu, hoje voltei lá. Na aproximação ao prédio, o friozinho do costume ao encarar a placa por cima da porta: «Gulosos Compulsivo Anónimos». É intimidante, sabes? e é preciso coragem. Entrei e juntei-me às outras pessoas que já estavam sentadas em cadeiras dispostas em círculo. Conheço as histórias de alguns daqueles rostos e senti pena de um ou outro, porque lhes pressenti a culpa. Quando chegou a minha vez, elevei a voz e pronunciei com determinação: «Eu alimento-me de forma compulsiva, mas há exactamente 18 dias que não cedo à tentação».
Pecado que me coube em sorte: a Gula
Mote: Pedro
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